O conceito de regime de informação tem sido utilizado com frequência na área da Ciência da Informação como arcabouço para análise de políticas de informação, pois permite uma análise mais abrangente e que integra diferentes perspectivas. Albagli e Maciel (2011) argumentam que a concepção de regime de informação assumiu relevância no Brasil a partir dos trabalhos de Bernd Frohmann (1995), Maria Nélida González de Gómez (2002) e Sandra Braman (2004). Tendo por base os trabalhos citados acima e outras referências de Braman (2006, 2009 e 2011), Maria Nélida González de Gómez (2003, 2007, 2012 e 2015), e trazendo para essa discussão o trabalho de Hamid Ekbia e Thomas Evans (2009), buscaram-se referenciais fundamentais para o empreendimento dessa pesquisa.
Em um texto bastante conhecido e estudado no Brasil em pesquisas sobre o regime de informação, Bernd Frohmann desenvolveu uma abordagem sobre a política e os regimes de informação a partir da teoria desenvolvida por Bruno Latour, Michel Callon e Michel Foucault (ALBAGLI; APPEL; MACIEL, 2014). De acordo com Frohmann (1995), a literatura até aquele momento sobre as políticas de informação restringia-se de suposições limitadoras que obscureciam as questões centrais das relações de poder que envolvem as políticas de informação.
Nesta mesma perspectiva, Frohmann (1995) enumerou 5 (cinco) interpretações das quais os estudos do campo da Ciência da Informação estavam limitados no que diz respeito às politicas de informação:
(i) As políticas de informação eram interpretadas como políticas de governo e deveriam ser restritas ainda mais como políticas de governo para documentos de governo.
(ii) Devido ao grande número de documentos na área de informação técnicocientífica, muitos autores sobre políticas de informação restringiram suas pesquisas aos problemas de produção, organização e disseminação da informação técnico-científica.
(iii) As políticas de informação estariam restritas à questão epistemológica. Nessa abordagem, as bases de conhecimento para formulação das políticas de informação estariam adstritas às disciplinas acadêmicas.
(iv) Havia uma fixação em questões instrumentais como implementação de tecnologias, otimização da comunicação entre departamentos governamentais, o crescimento de acesso aos documentos de governo, transferência de informação técnico-científica e questões similares à gestão de informação
governamental.
(v) Com o foco em problemas e questões instrumentais no que diz respeito ao estabelecimento de limites entre disciplinas, era desconsiderada a intricada rede de questões concernentes às relações entre informação e poder.
Baseando-se em Andrew A. Aines e Melvin S. Day (1974), Frohmann expôs que, de acordo com cada situação, controle e poder são exercidos sobre os constituintes dos sistemas de informação, mesmo sem a ação direta dos governos, ou seja, neste sentido há um pacto informal, o regime de informação que daria os contornos para o desenvolvimento dos sistemas ou redes.
Nessa perspectiva, Frohmann denominou regime de informação os sistemas que emergem e se estabilizam de forma mais ou menos definida e que se estabelecem à nossa volta com seus fluxos informacionais no âmbito da cultura, da pesquisa acadêmica, da economia, da indústria e comércio ou ainda de forma híbrida. Assim, na concepção de Frohmann o regime de informação é um “[…] sistema mais ou menos estável ou rede na qual a informação flui através de canais determináveis – de produtores específicos, via estruturas organizacionais específicas, para os consumidores ou usuários específicos” (FROHMANN, 1995, p.5).
Para Frohmann, “descrever um regime de informação significa mapear os processos agonísticos que resultam em estabilizações tentativas e difíceis de conflitos entre grupos sociais, interesses, discursos e até artefatos científicos e tecnológicos” (FROHMAN, 1995, p. 5).
Nesse sentido, Frohmann propôs, à época da publicação de seu artigo, que o objetivo para a pesquisa em política de informação era a clareza quanto à representação dos regimes de informação: como eles se originam e se estabilizam; como são determinadas as relações sociais; e, como as formas específicas de poder são exercidas através deles. Para Frohmann (1995, p.6): “A descrição de uma política de informação desta maneira torna-se a descrição da genealogia de um regime de informação”.
No entendimento de Frohmann há uma série de complexidades no que diz respeito ao estabelecimento dos regimes de informação. Essas complexidades extrapolam as noções de políticas de informação desenvolvidas pela Ciência da Informação. As diferentes instâncias e atores envolvidos no âmbito dos grupos sociais, interesses, discursos e até questões de cunho científico e tecnológico poderiam ser compreendidos melhor a partir da teoria ator-rede. Tendo como base a teoria ator-rede desenvolvida por Bruno Latour e Michel Callon, Frohmann expôs que essa teoria oferece um conjunto de recursos para compreensão das complexidades de interações entre os atores humanos e não-humanos conforme veremos na próxima seção deste capítulo.
Na perspectiva de Braman, as transformações ocorridas na virada do século XX para o século XXI trouxeram impactos diretos na forma como os Estados Nacionais passaram a ser governados. Logo na introdução de seu livro “Change of state”, a autora expôs:
Pode parecer tarde para falar de uma introdução à política de informação, mas só agora, com a transformação do burocrático welfare state em estado informacional, que o assunto aparece totalmente. Nós passamos o ponto de inflexão: enquanto a política de informação é uma das mais antigas formas de governo, houve uma fase de mudança – uma mudança de estado na medida em que os governos deliberadamente, explicitamente, e de forma consistente controlam a criação, o processamento, os fluxos, e utilizam a informação para exercer o poder (BRAMAN, 2006, p.1, tradução nossa).
Dessa forma, os antigos modelos de estruturação da indústria, as tecnologias de informação e os modos de produção culturais vão sendo substituídos por novos modos de operação para criação de conhecimento, meta-tecnologias informacionais e novos arranjos de produções infocomunicacionais. Para a autora, novas especializações apareceram, tais como sistemas de informações geográficas; interesses em tópicos familiares, como os arquivos e estruturas de dados que foram reconsiderados, devido ao exercício do poder informacional (BRAMAN, 2006).
Conforme Braman há uma intricada relação entre os diversos atores nos processos regulados e que são vastos os componentes desses processos.
O vasto campo no qual os sistemas jurídicos particulares aparecem, mudam, e desaparecem incluem normas éticas e comportamentais, hábitos de discurso, práticas culturais, estruturas de conhecimento, formas organizacionais, setores privados e tomadores de decisão individuais, e tecnologias bem como as leis formais e regulações dos governos oficialmente reconhecidos (BRAMAN, 2006, p. 2).
Outro aspecto interessante para construção teórica do regime de informação é que o conceito de regime foi importado por Sandra Braman da esfera discursiva da política internacional, onde são amplamente utilizadas teorias do regime internacional, conforme González de Gómez (2012, p.52).
Além das teorias do regime internacional, o trabalho de Braman (2004) foi estruturado a partir de mais duas bases de sustentação teórica: a teoria dos sistemas adaptativos complexos, desenvolvido por John Henry Holland e o conceito de campo desenvolvido por Pierre Bourdieu (1989). Embora estes conceitos não tenham sido trabalhados para o desenvolvimento desta pesquisa, cumpre-nos oferecer uma ideia geral sobre o que tratam. Sistemas adaptativos complexos são sistemas que são constituídos de elementos heterogêneos em constante interação e passíveis de constantes mudanças e adaptabilidade. Já conceito de campo desenvolvido por Bordieu (1989) trata de um espaço simbólico onde ocorrem diferentes embates entre os atores envolvidos. Esses embates caracterizam, determinam e validam o que será legitimado pelo grupo dominante de atores em um contexto social.
Conforme observado, Braman (2004) fundamentou a sua análise sobre a teoria do regime no campo das relações internacionais. Nesse sentido, a teoria do regime complementa e contextualiza a análise da política global de informação. Além disso, provê uma estrutura para compreensão pelos quais os
sistemas complexos de entidades geopolíticas sofrem transformações dentro do campo legal. No caso específico, Braman (2004) tratou da política de informação.
Sobre este aspecto, Braman expôs:
Os estudiosos das relações internacionais desenvolveram a teoria regime no início de 1980 para referirem-se aos recursos de decisões internacionais que caracterizam uma área de assunto particular mesmo que esses recursos ainda não tivessem sido incorporados em acordos formais geopoliticamente reconhecidos. Este corpo teórico foi uma resposta ao reconhecimento de que os atores não estatais bem como os estados foram importantes internacionalmente, e que os estados foram altamente interdependentes, em vez de atores autônomos, e que os novos tipos de questões políticas – tais como os que envolvem informação e comunicação – foram se tornando particularmente importante em nível internacional (BRAMAN, 2009, p. 33, tradução nossa).
Entre os autores que contribuíram para a Teoria do Regime importados dessa esfera discursiva por Braman, podemos destacar Stephen D. Krasner.
Para Krasner (20124), os regimes definem-se como princípios, normas, regras e procedimentos de tomada de decisões em torno das quais convergem as expectativas dos atores. Àquela altura, o autor estava se referindo às relações internacionais independentemente do campo ou segmento de ação.
De acordo com Krasner:
Os regimes podem ser definidos como princípios, normas e regras implícitos ou explícitos e procedimentos de tomada de decisões de determinada área das relações internacionais em torno dos quais convergem as expectativas dos atores. Os princípios são crenças em fatos, causas e questões morais. As normas são padrões de comportamento definidos em termos de direitos e obrigações. As regras são prescrições ou proscrições específicas para a ação. Os procedimentos para tomada de decisões são práticas predominantes para fazer e executar a decisão coletiva (KRASNER, 2012, p. 94).
Krasner (2012) enumerou o que ele chamou de “explicações para o desenvolvimento dos regimes”. Assim, na concepção do autor, havia cinco elementos importantes que compõem os regimes, a saber:
(1) O auto interesse egoísta – O auto interesse egoísta seria o desejo de um ator ampliar suas funções em detrimento das funções dos outros atores. O ator egoísta se preocuparia apenas com as funções dos outros atores quando essas funções afetassem as suas.
(2) O poder político – Há duas interpretações para a importância do poder político na constituição dos regimes: (a) o poder é utilizado para realizar o bem comum e asseguraria resultados ótimos para o sistema como um todo; (b) o poder é utilizado para fortalecer a atuação de atores específicos. Nesse caso, o poder seria exercido para o fortalecimento de interesses próprios e individuais.
(3) As normas e os princípios – As normas e princípios são as características que definem os regimes, ou seja, são as características que fundamentam criticamente os regimes a partir da criação, persistência e esclarecimento dos mesmos.
(4) Usos e costumes – Os usos e costumes são características ligadas de alguma forma ao auto interesse egoísta, considerando que os primeiros acordos eram baseados em práticas e rotinas de padrões regulares. Dito de outra forma, os comportamentos dos atores acabam ganhando legitimidade, o que implica na criação de normas e estabelece os princípios comuns aos atores participantes de um determinado processo.
(5) O conhecimento – O conhecimento seria entendido por Krasner como: “a soma da informação técnica e das teorias a respeito dessa informação que gera um consenso pleno em um determinado momento entre os atores interessados e cujo objetivo é servir como guia para que políticas públicas alcancem alguma meta social” (HAAS, 1980 apud KRASNER). Sob esse aspecto, o conhecimento é importante para a criação de uma base de cooperação, pois através do conhecimento é possível compreender algumas interconexões que foram compreendidas a priori.
Na concepção de Krasner, os dois elementos mais destacados para a criação dos regimes seriam o auto interesse egoísta, notadamente o interesse econômico e o poder político. A aplicação das normas e princípios variaria de acordo com o comportamento dos atores envolvidos em cada sistema.
Em um trabalho anterior ao “Change of State”, Sandra Braman (2004) definiu as bases do que seria o Emergent Global Information Policy Regime ou Regime Global Emergente de Informação.
A autora destaca que o regime de informação seria global; pois, envolve atores estatais e não estatais, e era emergente pelo fato de que no campo da política de informação possui características que estavam em desenvolvimento. Desta forma, o regime pode ser definido como um quadro normativo e regulatório internacional que possui menos rigidez e formalidade que o sistema jurídico. Um regime oferece estratégias operacionais, desenvolve uma hierarquia de valores e define as regras para negociação. Ademais, oferece normas éticas e comportamentais, práticas culturais, hábitos, estruturas de conhecimento, formas organizacionais, processos de decisão no setor privado, tecnologias de informação, leis formais e regulamentações de governo.
Com isso, para a autora, o propósito, a dimensão e a aplicabilidade do regime de informação envolvem:
a) O Governo – as instituições formais, as regras e práticas de entidades geopolíticas historicamente constituídas.
b) A Governança – instituições formais e informais, regras, acordos e práticas de atores estatais e não estatais dos quais as decisões e comportamentos possuem um efeito que constituem a sociedade.
c) A Governamentalidade – o contexto cultural e social onde surgem e são sustentados os modos de governança. O conceito de governamentalidade utilizado por Braman (2004) foi baseado na concepção de Michel Foucault, que será abordado na seção seguinte.
Igualmente, a abordagem do regime para a política global de informação possui utilidade, pois oferece proposições heurísticas que ajudam a identificar tendências comuns em fenômenos e processos dispersos através de arenas políticas históricas tratadas de forma analiticamente diferentes (BRAMAN, 2004).
Dessa maneira, podemos constatar que o escopo e abrangência de um regime é atingir efeitos específicos com a redução de prováveis incertezas. Isto pode ser conseguido através da coordenação de políticas nacionais com regras comuns e procedimentos de solução de controvérsias. Para Braman (2004), isso reduz os custos de transações comerciais, aumenta a importância da reputação, e diminui o incentivo para trapacear. Os regimes também podem reduzir a intensidade do conflito por remodelar os interesses dos atores e permitem mudanças de posição.
Em outro trabalho, Braman definiu conceitualmente algumas características que fazem parte de um regime de informação. Pode ser percebida na definição a seguir a ampliação do escopo do regime de informação para outras demandas como defesa e agricultura, ou seja, há uma aplicabilidade teórico-metodológica do regime de informação que não inclui apenas a temática das políticas de informação. Além disso, podemos constatar, mais uma vez, que é evidente a fundamentação de Braman no trabalho de Stephen Krasner, abordado anteriormente neste trabalho:
Um regime inclui princípios explícitos ou implícitos, normas, regras, procedimentos de tomada de decisão em torno das expectativas dos atores que convergem em torno de uma área particular. Especificar a área particular – o problema da política que é objeto da tomada de decisão – é pertinente porque um regime para assuntos de defesa, digo, pode se diferenciar em significantes modos de um regime para agricultura. Princípios são crenças em fatos, causas, e equidade. Normas são padrões de comportamentos definidos em termos de direitos e obrigações. As regras são prescrições específicas e proscrições contra ação. Procedimentos de tomada de decisão são práticas predominantes para realizar e implementar escolhas coletivas (BRAMAN, 2009, p. 33).
Uma abordagem teórica construída no Brasil para os regimes de informação foi dada por González de Gómez, como:
(…) um modo de produção informacional dominante em uma formação social, conforme o qual serão definidos sujeitos, instituições, regras e autoridades informacionais, os meios e os recursos preferenciais de informação, os padrões de excelência e os arranjos organizacionais de seu processamento seletivo, seus dispositivos de preservação e distribuição. Um “regime de informação” constituiria, logo, um conjunto mais ou menos estável de redes sóciocomunicacionais, formais e informais nas quais informações podem ser geradas, organizadas e transferidas de diferentes produtores, através de muitos e diversos meios, canais e organizações, a diferentes destinatários ou receptores, sejam estes usuários específicos ou públicos amplos (GONZÁLEZ DE GÓMEZ, 2002, p. 34, grifos da autora).
E mais:
Um regime de informação, assim, está configurado, em cada caso, por plexos de relações plurais e diversas: intermediáticas (TV, jornais, conversas informais, Internet etc.); interorganizacionais (empresa, universidade, domicílios, associações etc.) e intersociais (atores comunitários, coletivos profissionais, agências governamentais, entre outros).
É importante observar, conforme a definição de González de Gómez, que se há um modo de produção informacional dominante em uma sociedade coexistem também outros modos contra-hegemônicos que concorrem pela predominância nas diversas redes formais e informais. Há momentos em que, na disputa das forças hegemônicas e contra-hegemônicas, elas se contrapõem, em outras situações se ajustam e em outras criam alianças no âmbito das relações de poder.
Em outro trabalho, González de Gómez (2007, p. 164) abordou o regime de informação a partir do cruzamento de três perspectivas: o “modo de informação” de Mark Poster (1990), o “regime global de informação” de Sandra Braman (2004) e o “regime de informação” de Bernd Frohmann (1995). O regime de informação na concepção de González de Gómez é um instrumento analítico para pensar a zona de cruzamentos em que a economia, a cultura e os estudos em Ciência da Informação busquem um caminho convergente de entendimento e descrição.
Conforme González de Gómez, os regimes de informação têm sido considerados como o modo de informação dominante que define quem são os sujeitos, as organizações, as regras e as autoridades informacionais. Logo, os meios e recursos preferenciais de informação, padrões de excelência e os modelos de sua organização, interação e distribuição à medida que são vigentes em certo tempo, lugar e circunstância também são definidos. Como um entrelaçamento de relações e agentes, um regime de informação está exposto a algumas possibilidades e condições culturais, políticas e econômicas, que nele se expressam e se constituem (GONZÁLEZ DE GÓMEZ, 2012).
De acordo com González de Gómez:
Como uma de suas atribuições mais frequentes, o regime de informação remete às relações informação-poder, relações que hoje estariam alavancadas pela pressuposição de que a informação, como algo imerso nas tecnologias digitais e ubíquas, seria aquilo que nelas circula e as dinamiza. É nessa abordagem que o entendimento do termo “informação” vai qualificar processos de transformação de longo alcance, sendo incluído na composição de vários novos sintagmas, tal como economia da informação, modo de informação, infraestrutura de informação (GONZÁLEZ DE GÓMEZ, 2012, p. 44, grifos da autora).
As tecnologias de informação potencializaram o uso da informação através dos sistemas de comunicação e se tornaram cada vez mais frequentes nas relações de lógicas produtivas para criação de conhecimento. Apresentam-se dessa forma novos cenários globais para circulação e apropriação do conhecimento no campo da política, da economia, da ciência, da cultura, entre outros. Logo, o regime de informação apresenta-se como uma construção conceitual que permitiria compreender as diversas práticas e políticas de informação.
Em outro trabalho, González de Gómez (2012, p. 50) reforça que o regime de informação como conceito teórico-metodológico tem sido utilizado como um dos recursos interpretativos para abordar as relações entre política, informação e poder. A autora elaborou sua análise baseada em Bernd Frohmann (1984), Sandra Braman (2004) e Hamid Ekbia e Tom Evans (2009) demonstrando o desenvolvimento do conceito de regime de informação elencando os principais modelos conceituais contidos nesses autores.
Assim, González de Gómez corrobora com o nosso exposto:
Com ênfases nas dinâmicas antes que nas estruturas, o regime de informação permitiria associar a ancoragem espaçotemporal e cultural das ações de informação aos contextos regulatórios e tecnológicos que intervêm e perpassam diferentes domínios de atividade, agências e organizações (GONZÁLEZ DE GÓMEZ, 2012, p. 56).
E mais:
Entre atribuições dos regimes de informação, uma das principais seria colocar em evidência essa tensão entre as configurações socioculturais das interações em que se manifestam e constituem os diferenciais pragmáticos de informação, e as estruturações jurídicos-normativas, técnico-instrumentais e econômico-mercadológicas, que visam a sobredeterminar essa configuração, com alguma imposição de direção ou valor. As regras, as normas, os padrões, os códigos, seriam justamente o domínio onde acontecem essas tensões e essa imposição (GONZÁLEZ DE GÓMEZ, 2012, p. 56).
Delaia e Freire (2010, p. 121), tendo como base o texto “Escopo e abrangência da Ciência da Informação e a Pós-Graduação na área: anotações para uma reflexão”, publicado em 2003 por Maria Nélida González de Gómez, propuseram uma operacionalização das diferentes partes que integram um regime de informação, quais sejam:
- Atores/Humanos
- Artefatos/Infraestrutura
- Dispositivos/Políticas
- Ações/Diretrizes
A Figura 2 demonstra o arranjo que compõe um regime de informação:
Figura 2 – Composição de um regime de informação
Fonte: Delaia; Freire, 2010, p. 121.
Em outra proposta sobre a compreensão do conceito de regime de informação, podemos observar uma definição que nos dá contornos sobre as questões tratadas no marco regulatório da indústria de petróleo e gás natural no Brasil, sobretudo quando trata da sonegação e/ou substituição de informações.
O regime de informação remete à distribuição do poder formativo e seletivo de “testemunhos” sociais – entre atores e agências organizacionais, setores de atividades, áreas do conhecimento, regiões locais e redes internacionais e globais – , seja na medida em que definem, constroem e estabilizam as zonas e recursos de visibilidade social regulada, seja pela sonegação e/ou substituição de informações, seja por efeitos não totalmente intencionais que resultantes daqueles atos seletivos de inclusão/exclusão de atores, conteúdos, ações e meios. Cada vez que mudam os eixos de ênfases e relevância dos atores sociais e suas demandas e interesses, mudariam também todos ou muitos dos parâmetros que configuram o “locus” de entendimento e definição de recursos e ações de informação (GONZÁLEZ DE GÓMEZ; CHICANEL, 2008, p. 4, grifos das autoras).
Outra abordagem teórica referente ao regime de informação encontra-se em Hamid Ekbia e Tom Evans (2009). Ekbia e Evans abordaram o regime de informação a partir da administração do uso de terras no meio oeste dos EUA e argumentaram que é vasta a possibilidade de utilidade e aplicação deste conceito.
Os autores discutem, no caso específico da gestão de terras nos EUA, onde houve um problema com múltiplas fontes de informação e como direcionar essas informações para melhores tomadas de decisão. Desta forma, os autores buscaram compreensão entre a noção de ação humana e como isto se relaciona com o contexto social em que esses atores estão inseridos (EKBIA; EVANS, 2009). Assim, Ekbia e Evans propuseram o confronto de informações a partir de diferentes fontes.
A informação nesse sentido assume um papel importante para as escolhas dos atores envolvidos: “[…] o papel da informação no uso de terras mudou para uma nova perspectiva. Um componente fundamental para essas decisões locais é que informações os atores possuem a sua disposição e como eles usam essas informações” (EKBIA; EVANS, p. 329, tradução nossa).
Tendo como argumentação teórica o trabalho de Buckland (1991) sobre a informação e sua natureza e capacidade de ser “informativa” e a obra “On reference” de Luc Boltanski e Laurent Thévenot (2006), Ekbia Evans argumentam que várias fontes de informação recebem tratamentos diferenciados porque eles pertencem a “mundos diferentes” – formas de governança em uma perspectiva que integra valores econômicos e sociais em uma abordagem analítica com diferentes regimes de verdade. Neste sentido, esses diferentes regimes de verdade incorporam vários regimes de informação que envolve diferentes formas de avaliar pessoas e objetos. Em cada “mundo” a informação adquire um sentido (EKBIA; EVANS, 2009).
Na concepção dos autores, a existência de políticas emanadas pelo poder político local no que diz respeito à gestão de terras não seria suficiente para as tomadas de decisão dos donos das terras. Entre outros aspectos, os donos das terras nos EUA consideram as informações vindas de familiares e
amigos, livros e oficiais do governo. Em contrapartida, as informações advindas de auditores fiscais e vendedores não eram consideradas para as suas tomadas de decisão, ou seja, eram consideradas principalmente as informações de caráter informal de grupos mais próximos aos donos de terras.
Na perspectiva traçada pelos autores os regimes de informação explicam as diferentes formas como objetos e práticas auxiliam na forma como as pessoas avaliam várias vias de informação, como essas vias se excluem, se acumulam, e se reforçam mutuamente. Isto posto, os regimes de informação são úteis para pensar os comportamentos de informação. No caso do trabalho dos autores, tratou-se dos donos de terra nos EUA.
Na próxima seção, foram consideradas algumas contribuições teóricas de outros autores para o arcabouço do teórico-metodológico dos regimes de informação.
Referência
COSTA, Alexandre S. O Regime de Informação: Um Olhar sobre o Marco Regulatório da Indústria de Petróleo e Gás Natural no Brasil. p. 23 – 37. Disponível aqui.